Primeiro Vôo em um Spitfire

Forgotten Battles, Ace Expansion Pack, Pacific Fighters, 1946 e Cliffs of Dover. Dúvidas, dicas, novidades e debates.
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komet163
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Primeiro Vôo em um Spitfire

Post by komet163 »

Primeiro Vôo em um Spitfire

Autor: Pierre Clostermann
Livro: O Grande Circo
Páginas:
Editora: Edições Flamboyant

Chegara o grande dia!

Nevara durante toda a noite, e o aeródromo refulgia sob o céu azul. Meu Deus, como a vida é bela!
Aspiro a plenos pulmões o ar gélido e sinto sob os pés estalar a neve, macia e elástica como um tapete oriental, despertando-me inúmeras recordações. É a primeira neve que vejo depois de tanto tempo...
À entrada da cabana que serve de abrigo entre os vôos, meu instrutor espera-me com um sorriso nos lábios.

- How do You feel? - O. K, Sir
- Respondo, tentando ocultar a emoção!
Well, let's have a try!

Recordar-me-ei, por toda a vida, do meu primeiro contato com o Spitfire; o que eu iria pilotar tinha a matrícula TO-S.
Antes de colocar o pára-quedas, detenho-me por um instante a contemplar o avião - as linhas nobres da fuselagem, o motor Rolls Royce finamente carenado; um autêntico puro-sangue...

- You have got her for one hour. Good luck!

Dono daquele bólido por uma hora; sessenta excitantes minutos!
Tento recordar os conselhos do meu instrutor. Tudo me parece tão confuso. . .
Preparo-me tremendo, ajusto o capacete, e, ainda aturdido pela quantidade de instrumentos, quadrantes, contatos e alavancas que se comprimem uns contra os outros - todos vitais e que devem ser infalivelmente manobrados no momento exato - avanço para a prova decisiva.
Examino cuidadosamente o cockpit drill, murmurando a frase sacramental:
BTFCPPUR - Brakes (freios), Trim (fletners de correção dos comandos), Flsys (flap, freio aerodinâmico), Contacts, Pression n(J sistema pneumático, Petrol (gasolina), Undercarriage (trem de pouso, escamoteável) e Radiator..."
Tudo está pronto. O mecânico fecha a porta atrás de mim, e eis-me encarcerado nesse monstro de metal que devo dominar.

Um último e rápido olhar.
All clear. Contact!

Manobro as bombas de mão e os botões da partida. A hélice começa a girar lentamente e, de súbito, com um barulho ensurdecedor, o motor arranca. Os canos de escapamento lançam longas línguas de fogo azul envoltas em negra fumaça, enquanto o avião treme como caldeira sob pressão. Retirados os calços, abro amplamente o radiador, pois esses motores resfriados a líquido aquecem-se muito rapidamente.

Com toda a prudência, avanço até a pista de partida que, limpa de toda neve, se destaca, escura carreira, em meio à alvura da paisagem.

- Tutor 26, You may scramble now, you may scramble now!

Pelo rádio, a torre de controle autoriza-me a levantar vôo.

Meu coração bate com violência. Ajusto o assento e com mão umedecida pela transpiração, adianto lentamente o acelerador. No mesmo instante sinto-me arrebatado por um ciclone. Frases soltas, de conselhos, vêm-me à memória:

“...Don't stick the nose too much forward!”

À minha frente, a enorme hélice que absorve toda a força do motor guarda uma distância muito pequena entre o diâmetro qual gira e o solo...

Timidamente levo o manche para diante. Com um grande choque, colando-me contra o encosto do assento, o Spitfire põe-se em marcha, acelerando, acelerando, enquanto vejo, de ambos, o aeródromo desfilar a uma velocidade crescente...

“...Keep her straight!”

Acionando freneticamente os pedais, domino algumas guinadas laterais e mantenho a reta da decolagem.
De repente, como por milagre, a respiração entrecortada pe1a emoção, sinto elevar-me no ar. Diviso vagamente árvores e casas que logo se desvanecem atrás de mim...
Rápido, recolho o trem de pouso, cerro a cobertura transparente do posto de pilotagem e o radiador, reduzo o acelerador e comando o passo da hélice para a velocidade de cruzeiro.
Enfim!... Gotas de suor correm-me pela fronte. Instintivamente meus membros reagem como as alav3ncas bem reguladas de um autômato. Os longos e fastidiosos meses de adestramento prepararam-me os músculos e os reflexos para este minuto.
Que deliciosa de sensibilidade de comandos! A mínima pressão do pé ou da mão basta para lançar o aparelho no céu...
Meu Deus, onde estou?
Tamanha é a velocidade que os poucos segundos decorridos levaram-me a uma dezena de quilômetros do aeródromo. A pista negra é apenas um traço escuro no horizonte.
Ainda receoso, experimento fazer uma curva. Passo, em seguida, 3cima da base e faço voltas à esquerda e à direita. Acionando ligeiramente o manche, subo a três mil metros num fechar de olhos.
Pouco a pouco a velocidade me embriaga, e torno-me afoito.
Um movimento de alguns milímetros do acelerador é suficiente para desencadear toda a fúria do motor.

Experimento realizar um vôo picado. Aciono lentamente o manche, 550, 600, 650 quilômetros por hora... A terra parece subir ao meu encontro em velocidade espantosa. Assustado, manobro instintivamente o leme de profundidade e, no mesmo instante, sinto a cabeça que se enterra entre os ombros, enqu3nto pesad3 massa de chumbo se 3bate sobre a coluna vertebral comprimindo-me contra o assento. Um véu negro ergue-se diante de meus olhos.
Como uma bola de aço caindo sobre um bloco de mármore, o Spitfire ressaltou sobre o ar elástico e, reto como um círio, subiu no espaço.
Apenas refeito do choque ocasionado pela força centrífuga apresso-me a reduzir o acelerador pois não tenho oxigênio e o aparelho continua a subir...

Pelo rádio ouço a torre de controle que me chama. Olho o relógio: meu Deus, já decorreu uma hora! Diria que foram apenas alguns segundos!
Agora devo pousar.
Abro completamente o radiador, fecho a gasolina, reduzo o passo da hélice ao mínimo, abro o " cockpit", levanto o assento e inicio a tomada de terreno.
Novamente, torno-me inquieto e agitado. O enorme motor diante de mim, com os grandes canos de escapamento, ocultando toda a pista. Sem visibilidade, obrigado a manter 3 cabeça dentro da cabina devido à formidável pressão do ar, estou preso na carlinga.
Faço baixar as rodas e os flaps. A pista aproxima-se velozmente.
Jamais conseguirei pousar. O aeródromo parece, ao mesmo tempo, estreitar-se e saltar-me aos olhos. . . Aciono o manche; aciono-o desesperadamente; o aparelho mergulha com um choque brutal que ressoa na fuselagem e.. . sinto-o rolar desajeitadamente sobre o solo.
Um golpe de freio à direita, outro à esquerda, e o Spitfire se detém no extremo da pista.
As vibrações do motor girando vagarosamente lembram os batimentos dos flancos de um cavalo de corrida estafado...
Meu instrutor sobe na asa, auxilia-me a retirar o pára-quedas e sorri vendo o meu rosto pálido e abatido.
Dou dois passos, mas, completamente atordoado, vejo-me obrigado a apoiar-me na fuselagem do avião.

- Good show - you see, nothing to worry about!

Se ele soubesse, porém, como estou orgulhoso. . . Enfim, pilotei um Spitfire! Como me parece belo e cheio de vida! Uma obra prima de harmonia e força, mesmo neste instante em que o veio imóvel.
Delicadamente, como se acaricia uma face de mulher, passo a mão sobre o alumínio de suas asas, frio e liso como um espelho, dessas asas que me levaram ao céu. . .
Regressando à cabana, levando o pára-quedas nas costas, volto-me ainda uma vez e penso no dia em que, em esquadrilha, terei o meu Spitfire que conduzirei ao combate, que guardará minha vida no espaço estreito do seu "cockpit", e que amarei como a um amigo fiel...

Abraços a todos.
Komet
“Não erreis: Deus não se deixa escarnecer; porque tudo o que o homem semear, isso também ceifará”. Gálatas 6:7.
31_CrossBones
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Re: Primeiro Vôo em um Spitfire

Post by 31_CrossBones »

:Skull_anim:

S!
komet163 wrote: Enfim, pilotei um Spitfire!
:)

SP!
Os políticos são como as fraldas: devem ser trocados constantemente, e sempre pelo mesmo motivo.

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PHANTHOMAZ

Re: Primeiro Vôo em um Spitfire

Post by PHANTHOMAZ »

PILOTAR UM CAÇA DEVE SER COMO VESTIR UMA ARMADURA VOADORA :clap:
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